segunda-feira, 11 de dezembro de 2017

E a tal da felicidade?

Auguste Rodin - Le Penseur
Quero agradecer o convite para estar aqui com vocês. Fiquei, aliás, me senti honrado com o convite. Hoje o tema da nossa palestra é sobre a Felicidade. Esta coisa tão incompreensível quanto a Esfinge de Gizé - você sabe que a esfinge está ali, mas não tem a menor ideia como e por que está ali, nem quem a colocou, nem o sentido, nem a necessidade, nem o significado, nem quem a fez, nem quem a projetou. Você sabe por que vê que existe aquele imenso bloco de calcário esculpido no que hoje é um grande deserto. 

Quando foi construída, ali havia um jardim, florestas, água, flora e fauna em abundância, e hoje persiste solitária, sem nenhum sentido, no meio de um imenso e escaldante deserto. É isto que vocês entendem como felicidade? Uma coisa sólida, imune às intempéries, mesmo que perca o significado?

Vejamos um automóvel. Ele existe, e nele está o resultado de pesquisas, projetos e trabalho, tal qual a Esfinge. Tem vidro, plástico, borracha, motor, caixa de marcha, tanque de combustível, etc. Você lê no manual as milhares de partes que compõem o seu carro. Ele existe... É seu! Transporta as suas dores, as suas lágrimas, as suas angústias, as suas esperanças, e tudo mais que carrega consigo, até que começa a dar problemas, precisa de ajustes, de manutenção. O seu carro é um projeto de felicidade? Não, não é.

O que nos faz felizes hoje não necessariamente será a garantia do sorriso eterno. Quantos de vocês aqui presentes já fizeram ou receberam juras de amor que acabou virando um pesadelo? Um amor que foi construído no jardim do romantismo que não foi capaz de suportar um dia apenas no deserto da vida.

Antes de vir para cá, andei pesquisando aqui e ali, ouvindo transeuntes, pessoas próximas e também distantes. Vamos lá verificar de perto:

O que temos no dicionário:
Felicidade é a qualidade ou estado de ser ou estar feliz.

O que falam os religiosos:
Felicidade é o estado de uma consciência plenamente satisfeita como amor de Deus;

O que dizia a professora da infância:
Felicidade é ser feliz.

E a estagiária do escritório:
Felicidade é o contentamento pessoal, íntimo e intransferível.

Sobre isto o que pensa o novo rico:
Felicidade é poder comprar tudo o que eu sempre quis.

E o moderninho dependente High Tech:
Felicidade é um programa virtual.

E para os físicos  e astro-físicos?
Felicidade é adimensional, mas talvez um dia possamos encaixa-la na Teoria das Cordas.

A garotinha zen da faculdade:
Felicidade é etérea.

O primo agnóstico:
Felicidade não existe tal qual pensamos

Agora, saindo do anonimato da multidão que atropela as calçadas e passeios públicos, vamos aos pensadores:

O que é a felicidade para o poeta:
Ser feliz sem motivo é a mais autêntica forma de felicidade. (Carlos Drummond de Andrade)

E para o monge budista:
Não existe um caminho para a felicidade. A felicidade é o caminho. (Thich Nhat Hanh)

O escritor:
Saber encontrar a alegria na alegria dos outros, é o segredo da felicidade. (Georges Bernanos)

O romancista:
Felicidade é a certeza de que a nossa vida não está se passando inutilmente. (Érico Veríssimo)

O psicanalista:
A felicidade é um problema individual. Aqui, nenhum conselho é válido. Cada um deve procurar, por si, tornar-se feliz. (Sigmund Freud)

Disse o matemático:
Humanamente não existe um ser que seja feliz sem que o outro também seja. (René Descartes)

O poeta satírico:
Não existe felicidade perfeita. (Horácio)

O dramaturgo:
Nós não somos felizes, e a felicidade não existe; apenas podemos desejá-la. (Anton Tchekhov)

E concluindo, espero ter contribuído com vocês para que este dia seja validado na sua existência. Não sei falar mais nada sobre o assunto, sim, isto é verdade. Se algum de vocês levantar a mão, pedir a palavra e perguntar - Professor, afinal, o que é a felicidade? 

Vou antecipar a resposta - Não sei. Ela está aí, dentro de cada um de vocês, para uns ainda é um enigma, para os outros um sentimento de paz, para outros uma dor, para outros um sorriso - investiguem sua alma, perguntem ao seu coração - Minha felicidade é uma imagem real do que eu desejo para mim? Ela existe? Se existe, como ela realmente é? Saiam do passado, o que importa é o agora e esta felicidade de agora pode estar oculta pela imensa esfinge que não tem mais nenhum significado nem para você em para os que o cercam

É isto aí!

2 comentários:

  1. Minas Gerais, 16 de dezembro de 2017

    Caro Paulo,

    Felicidade foi esse texto e as três mil elucubrações que ele foi capaz de suscitar ... pensar é bom, embora há quem defenda que a grande bênção, mesmo, seja a ignorância. Talvez considerando que querer saber também dói e que a dor pudesse ser o contrário da felicidade, então pensar seria infelicidade.
    Mais ou menos como Fernando Pessoa (O horror de conhecer) sugere:
    "(...)
    Só a inocência e a ignorância são
    Felizes, mas não o sabem. São-no ou não?
    Que é ser sem no saber? Ser, como a pedra,
    Um lugar, nada mais.
    (...)
    Pensar, pensar e não poder viver!
    Pensar, sempre pensar, perenemente,
    Sem poder ter mão nele. Ah, eu sorrio
    Quando [por] vezes noto o inconsciente
    Riso vazio do bandido
    Rindo-se da inocência! Se ele soubesse
    O que é perder a inocência toda ...(...)"

    Seu texto começou e terminou em pergunta, em dúvida. E acho que a felicidade é isto: pergunta. Nem a inocência nem a ignorância, tampouco a arrogância das respostas que se negam à abertura; a felicidade é uma pergunta, um não-saber que procura, que busca.

    Adorei o texto!
    Abraços,
    Amanda

    ResponderExcluir
  2. Minas Gerais, 17 de dezembro deste terrível ano de 2017

    Querida Amanda,

    Primeiro, muito obrigado por vir aqui. Sempre me faz feliz a sua presença, que sei ser de tempo corrido e cronometrado, o que a valoriza mais ainda.

    E que poema é este do Pessoa? Coisa mais bonita! Coisa mais que mais bonita!

    No balanço de 2017, tenho que verificar várias variáveis tais como a política, a família, a empresa, eu pessoa, este blog e toda a vida que há no entorno dele (sim, claro, você incluída).

    Dói ver o Brasil entregue a corruptos, apátridas e cretinos, isto me magoa muito - ver uma política pública voltada para criar um abismo entre as classes, e o pior é ver empresários, como a Riachuelo, apoiarem uma política só para ricos.

    No campo pessoal, as coisas fluíram razoavelmente bem , tanto quanto na vida pública quanto na vida privada, mas em nenhum momento deparei com a felicidade, ali, olhando e sorrindo para mim com uma moça candidamente apaixonante e apaixonada.

    Então é uma busca, uma coisa que está sempre ali, lá, acolá, além de, em algum lugar do tempo/espaço. Também é minha angústia esta pergunta - afinal, o que é a felicidade?

    Um abraço!

    Paulo Abreu

    ResponderExcluir

Gratidão!