terça-feira, 31 de outubro de 2017

Odete, a única one-woman show com duplo carpado de Brasília

Recebi logo de manhã a chamada de Odete. Confesso que isto foi contrário a toda a extensa relação que vivemos nos últimos anos, com suas chamadas noturnas. Desta vez sua voz era pálida, tensa e desregrada de alegria.

Conta a lenda em Brasília que no auge da doação das coisas federais aos amigos dos amigos dos amigos insuspeitosíssimos no interesses da coisa privada, Odete foi chamada para animar um petit comité de exclusivos gaiatos de determinado maestro mor da orgia nacional. Em lá chegando com sua discreta vestimenta romana de domínio público, viu tanta sacanagem privada que se sentiu impotente com tamanha concorrência e aquele foi, segundo consta, o único dia frustrante da sua notável carreira de one-woman show. Nunca mais aceitou os incansáveis convites para retornar à famosa mansão do maior defenestrador tabajara de todos os tempos - aos amigos dizia que se sentia enojada de tanta sacanagem junta.

- Odete?! Adoro ouvir sua voz!!

- Oi amor.

- Caramba, o que está acontecendo, querida?

- Nada e tudo, não é?

- Humm, está séria hoje, melhor não brincar. Me conte, Odete, o que a fez ficar assim?

- Demorou ... como sabe, amore, eu não faço delação premiada, eu só falo a verdade.

- Sim, claro, eu sei e sei muito bem mesmo.

- Então! Outro dia estava fazendo um movimento duplo sanduíche carpado com a Cíntia, minha manager de aberturas estéticas psico-emotivas neuro-trans-sensoriais, quando de repente, assim do nada ela ...

- Espera, Odete, meu bem - o que vem a ser um duplo sanduíche carpado?

- Credo, vai dizer que você nunca viu nada a este respeito? Que vidinha mais ou menos esta sem euzinha ao seu lado, hem?! Primeiro que só funciona com duas fêmeas cis do sexo feminino duplo X. Tudo bem até aí?

- Se você falou, acredito.

- Então, meu bem, vamos por etapas. O carpado é um movimento executado com o corpo dobrado nos quadris, pernas esticadas sem flexão dos joelhos e pés distendidos - movimento anatomicamente feminino.

- Interessante, Odete ...

- Nossa, que bom que gostou. O duplo é claro, duas moças com capacidade olímpica e o sanduíche é a forma como se vê o movimento, entendeu, meu bem? É uma modalidade olímpica personal íntima.

- Ah, agora eu acho que consegui imaginar a cena. Desculpa a interrupção.

- Não, tudo bem, você precisa vir me ter em Brasília para te mostrar o carpado twist pivotante que guardei só para você (gargalhadas).

- Finalmente ouço alegria sair da sua boca, Odete. Carpado twist pivotante ... carpado twist pivotante ... uau uau uau ...

- É por você, amore, e este calor abrasador de Brasília. Vem, amore, vem me ter.

- Mas, voltando à Cíntia ...

- Ah, é, então, pois é. Estávamos lá em movimento sincronizado do carpado sanduíche quando do nada entrou na nossa academia uma mulher bela, recatada e do lar.

- Aquela?

- Não, aquela não frequenta movimentos sincronizados. Mas foi outra, Débora K. Já falei dela?

- Não que eu lembre, Odete.

- Débora K. foi causa protagonizadora de ação cinematográfica, discreta e compulsória de tradicional família endinheirada, rica e poderosa das terras tupy-guaranys, cuja filha fora casada com um alto escalão das Esplanadas que teve um caso sinistro com a moça. A família da esposa deu a Débora K. uma aposentadoria milionária enquanto o ex-marido ex-super tudo do Planalto saiu para um retiro espiritual despojado de valores materiais, no Nepal.

- Que coisa, hem. No Nepal, hem??

- Bobo, você entendeu. Débora K. nos contou que estava em fantástica festa de Madame V., uma hostess incrível da Asa Norte, em requentado endereço de triste memória para uns ainda por aí. Madame V. confidenciou-lhe que escutou uma bomba de Karla T., uma mocinha também de família tradicional da elite financeira do Plano Piloto, disputadíssima no mercado imobiliário por ter desenvolvido uma técnica peculiar de pompoarismo única, exclusivamente para atender aos reclames dos velhinhos hipertensos da Esplanada que passam ao largo das azuizinhas.

- Uau ...

- Alto lá, querido, você pode abaixar o facho, você só vem a Brasília para me ter e só isto, hem!!

- Foi a empolgação, Odete, você é a mulher da minha vida.

- Ah, bom! Bem, Karlinha T. contou que estava atendendo aos reclames e babados literais de um dos velhinhos da turma do "você sabe quem", e no embalo da empolgação ele sussurrou estasiado que o sonho dele era ter também uma samantha do lar.

- Samantha do lar? O que é isto, Odete?

- Nossa, tenho que te ensinar tudo. Samantha é uma boneca de alta bionanotecnologia, que responde a estímulos com discernimento, tal qual uma imaculada bela, recatada e do lar.

- Credo, então desejam ficar mil anos e para isto estão querendo até clone da ...

- Não falei nada, não disse nada, não sei de nada, qualquer coisa que disser, pensar ou ousar pensar é sob a sua única e absoluta responsabilidade. 

- Puxa vida, Odete ...

- Ai, amore, para tudo, vem me ter em Brasília, vem, vem depressa, vem sem medo ...

- Eu ... eu ... eu ... alô! alô?! merda, logo agora foi acabar a bateria ...

É isto aí!

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